Prefeitura do Rio abre edital para Força Municipal sem aval da Câmara
Iniciativa do prefeito Eduardo Paes divide opiniões, levanta dúvidas jurídicas e gera debate sobre militarização e custos públicos
A Prefeitura do Rio de Janeiro abriu nesta semana um edital para a contratação de 600 agentes que farão parte da recém-anunciada Força Municipal de Segurança, mesmo sem a aprovação final do projeto de lei na Câmara de Vereadores. A nova força, que pretende atuar no combate a pequenos delitos e na prevenção de crimes de baixo potencial ofensivo, já nasce cercada de polêmicas políticas, jurídicas e financeiras.
Segundo o edital publicado no Diário Oficial, o processo seletivo prevê a contratação de agentes com salários iniciais de R$ 3.000, além de benefícios. A estimativa de custo inicial para os cofres públicos gira em torno de R$ 100 milhões por ano, considerando folha de pagamento, uniformes, equipamentos e viaturas. O efetivo inicial será treinado para atuar principalmente em áreas comerciais e turísticas da cidade, com o objetivo declarado de “reprimir pequenos furtos, coibir arrastões e garantir a sensação de segurança”.
Apesar da movimentação da prefeitura, o projeto de criação da Força Municipal ainda não foi aprovado em definitivo pela Câmara Municipal. A proposta precisa passar por segunda votação e enfrenta resistência de parlamentares da oposição e de entidades da sociedade civil. Críticos alegam que a medida extrapola a competência constitucional dos municípios, que não têm atribuição legal para criar forças de segurança armadas.
O prefeito Eduardo Paes, por sua vez, argumenta que a criação da força é uma resposta necessária ao aumento da criminalidade e à ausência de presença efetiva do Estado em algumas regiões da cidade. “O cidadão não aguenta mais esperar. Vamos agir onde o poder público estadual não consegue alcançar”, declarou.
Polêmica e questionamentos
A iniciativa levanta uma série de questionamentos jurídicos e operacionais. Especialistas em direito público alertam que a medida pode ser considerada inconstitucional, já que a Constituição Federal atribui às Polícias Civil e Militar, vinculadas aos estados, o papel de promover a segurança pública. Outros alertam para o risco de militarização da Guarda Municipal, que já deveria ter como foco a proteção do patrimônio público e o apoio à fiscalização municipal.
“Essa nova força pode criar uma zona cinzenta entre as atribuições das polícias estaduais e do município, gerando conflitos e até abusos”, afirma a professora de Direito Constitucional Mariana Nogueira, da UFRJ.
Além disso, o gasto elevado em um momento de crise fiscal municipal é motivo de críticas. Sindicatos e movimentos sociais questionam a prioridade dada à segurança em detrimento de áreas como saúde, educação e assistência social.
Um modelo controverso
Inspirada em parte no modelo das polícias municipais de cidades como Nova York e Medellín, a Força Municipal de Segurança do Rio promete ser equipada com tecnologia de monitoramento, câmeras corporais e treinamento em abordagem comunitária. No entanto, não está claro se os agentes terão porte de arma – ponto que também divide opiniões e ainda depende de regulamentação.
Com o edital já aberto, o governo municipal pressiona a Câmara para concluir a votação nos próximos dias, sob o argumento de que o processo precisa estar em andamento para que a nova força entre em operação ainda em 2025.
A população, por sua vez, segue dividida. Em bairros como Copacabana e Centro, moradores e comerciantes dizem que se sentem abandonados pelo Estado e apoiam qualquer medida que aumente a presença de agentes nas ruas. Já em áreas periféricas, lideranças comunitárias temem abusos e discriminação.
A criação da Força Municipal de Segurança pode marcar um novo capítulo na gestão da segurança pública no Rio — ou gerar um novo impasse jurídico e político no já conturbado cenário da cidade.